tag:blogger.com,1999:blog-71149802178217606242024-03-13T06:40:20.766+00:00o desejoDos olhos as meninas me saltaram / Para o nu que se estava descobrindo (Afonso Duarte)Unknownnoreply@blogger.comBlogger71125tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-90815756113025911432018-01-22T13:55:00.000+00:002018-01-22T14:05:12.418+00:00#71 - POEMETO IRÔNICO, Manuel Bandeira<br />
O que tu chamas tua paixão,<br />
É tão-somente curiosidade.<br />
E os teus desejos ferventes vão<br />
Batendo as asas na irrealidade...<br />
<br />
Curiosidade sentimental<br />
Do seu aroma, da sua pele.<br />
Sonhas um ventre de alvura tal,<br />
Que escuro o linho fique ao pé dele.<br />
<br />
Dentre os perfumes sutis que vêm<br />
Das suas charpas, dos seus vestidos,<br />
Isolar tentas o odor que tem<br />
A trama rara dos seus tecidos.<br />
<br />
Encanto a encanto, toda a prevês.<br />
Afagos longos, carinhos sábios,<br />
Carícias lentas, de uma maciez<br />
Que se diriam feitas por lábios...<br />
<br />
Tu te perguntas, curioso, quais<br />
Serão seus gestos, balbuciamento,<br />
Quando descerdes na espirais<br />
Deslumbradoras do esquecimento...<br />
<br />
E acima disso, buscas saber<br />
Os seus instintos, suas tendências...<br />
Espiar-lhe na alma por conhecer<br />
O que há de sincero nas aparências.<br />
<br />
E os teus desejos ferventes vão<br />
Batendo as asas na irrealidade...<br />
O que tu chamas tua paixão,<br />
É tão-somente curiosidade.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-54658588546583611982018-01-19T13:05:00.000+00:002018-01-19T13:05:29.700+00:00#70 - "Ao passar junto da vide", Al-Mu'tamid<span style="font-family: inherit;">Ao passar junto da vide</span><br />
<span style="font-family: inherit;">Ela arrebatou-me o manto,</span><br />
<span style="font-family: inherit;">E logo lhe perguntei:</span><br />
<span style="font-family: inherit;">Porque me detestas tanto?</span><br />
<span style="font-family: inherit;">Ao que ela me respondeu:</span><br />
<span style="font-family: inherit;">Porque é que passas, ó rei,</span><br />
<span style="font-family: inherit;">Sem me dares saudação,</span><br />
<span style="font-family: inherit;">Não basta beberes-me o sangue</span><br />
<span style="font-family: inherit;">Que te aquece o coração?</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-9146715525256615352018-01-04T13:06:00.000+00:002018-01-04T13:06:32.619+00:00#69 - EVOCAÇÃO DE SILVES, Al-Mu'tamidSaúda, por mim, Abu Bakr,<br />
Os queridos lugares de Silves<br />
E diz-me se deles a saudade<br />
É tão grande quanto a minha.<br />
Saúda o palácio dos Balcões<br />
Da parte de quem nunca os esqueceu.<br />
Morada de leões e de gazelas<br />
Salas e sombras onde eu<br />
Doce refúgio encontrava<br />
Entre ancas opulentas<br />
E tão estreitas cinturas!<br />
Mulheres níveas e morenas<br />
Atravessavam-me a alma<br />
Como brancas espadas<br />
E lanças escuras<br />
Ai quantas noites fiquei,<br />
Lá no remanso do rio,<br />
Nos jogos do amor<br />
Com a da pulseira curva<br />
Igual aos meandros da água<br />
Enquanto o tempo passava...<br />
E me servia de vinho:<br />
O vinho do seu olhar<br />
Às vezes o do seu copo<br />
E outras vezes o da boca.<br />
Tangia cordas de alaúde<br />
E eis que eu estremecia<br />
Como se estivesse ouvindo<br />
Tendões de colos cortados.<br />
Mas retirava o seu manto<br />
Grácil detalhe mostrando:<br />
Era o ramo de salgueiro<br />
Que abria o seu botão<br />
Para ostentar a flor.<br />
<br />
<div data-mce-style="text-align: right;" style="text-align: right;">
<span data-mce-style="font-size: 12pt;" style="font-size: 12pt;"><br /></span></div>
<div data-mce-style="text-align: right;" style="text-align: left;">
<span data-mce-style="font-size: 12pt;"><span style="font-size: x-small;">(versão de Adalberto Alves)</span></span></div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-33514371104577710052017-04-06T13:23:00.000+01:002017-04-06T13:23:03.907+01:00#68 - LITANIA, Eugénio de AndradeO teu rosto inclinado pelo vento;<br />
a feroz brancura dos teus dentes;<br />
as mãos, de certo modo, irresponsáveis,<br />
e contudo sombrias, e contudo transparentes;<br />
<br />
o triunfo cruel das tuas pernas,<br />
colunas em repouso se anoitece;<br />
o peito raso, claro, feito água;<br />
a boca sossegada onde apetece<br />
<br />
navegar ou cantar, simplesmente ser<br />
a cor dum fruto, o peso duma flor;<br />
as palavras mordendo a solidão,<br />
atravessadas de alegria e de terror;<br />
<br />
são a grande razão, a única razão.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-53905913559317028972017-03-23T13:44:00.000+00:002017-03-23T13:44:10.307+00:00#67 - DEDICATÓRIA, Rita Taborda Duarte<span style="font-size: 10pt;">Não<br />
te ofereço<br />
a rosa<br />
mas<br />
o nome<br />
da rosa<br />
<br />
que<br />
serviria<br />
meu amor<br />
oferecer-te<br />
a rosa<br />
se dura<br />
a rosa<br />
pouco mais<br />
que o tempo<br />
em que te<br />
digo rosa?<br />
<br />
Não te<br />
ofereço<br />
a rosa<br />
mas<br />
o nome<br />
meu amor<br />
do amor<br />
da rosa<br />
eco<br />
do que te digo<br />
repetido<br />
e mais rosa<br />
te ofereço<br />
se é<br />
rosa<br />
o que redigo<br />
<br />
(rosa por cem vezes repetido)<br />
<br />
do que<br />
te dar<br />
a rosa<br />
que<br />
não<br />
dizendo<br />
então<br />
de amor<br />
desdigo<br />
</span><br />Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-12115859896503818152017-03-07T13:20:00.000+00:002017-03-07T13:20:05.488+00:00#66 - GREEN GOD, Eugénio de AndradeTrazia consigo a graça<br />
das fontes quando anoitece.<br />
Era o corpo como um rio<br />
em sereno desafio<br />
com as margens quando desce.<br />
<br />
Andava como quem passa<br />
sem ter tempo de parar.<br />
Ervas nasciam dos passos,<br />
cresciam troncos dos braços<br />
quando os erguia no ar.<br />
<br />
Sorria como quem dança.<br />
E desfolhava ao dançar<br />
o corpo, que lhe tremia<br />
num ritmo que ele sabia<br />
que os deuses devem usar.<br />
<br />
E seguia o seu caminho,<br />
porque era um deus que passava.<br />
Alheio a tudo o que via,<br />
enleado na melodia<br />
duma flauta que tocava.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-20872573293685595292017-01-27T13:46:00.000+00:002017-01-27T13:46:04.746+00:00#65 - CAMPONESES, Abel Sabaoth2<br />
<br />
O quarto das cebolas.<br />
Por trás da porta esburacada<br />
uma rapariga nua<br />
de belíssimas mamas enxutas puxadas para cima<br />
um cão de lombo comprido o pêlo esticado<br />
outra rapariga de mamilos violentos<br />
-- um sol viúvo.<br />
<br />
<span style="font-size: x-small;">Praia da Granja</span><br />
<span><span style="font-size: x-small;">-- Inverno de 2005</span></span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-26392340042011568432017-01-09T13:29:00.000+00:002017-01-09T13:29:08.842+00:00#64 - PASTORAL, Carlos QueirósPor ser tão leve o teu passar<br />
Na estrada, à tarde, quando vens<br />
De pôr o gado que não tens,<br />
A pastar...<br />
<br />
Por ser tão brando o teu sorrir,<br />
Tão cheio de feliz regresso<br />
Do longe prado, onde apeteço<br />
Contigo ir...<br />
<br />
Por ser tão breve o teu querer<br />
Alguém que perto de ti passe<br />
E, porque a tarde cai, te abrace,<br />
Sem nada te dizer...<br />
<br />
Por ser tão calmo o teu sonhar<br />
Que já é tempo de não ter<br />
Esse rebanho de pascer,<br />
Mas outro de amamentar...<br />
<br />
É que eu me perco no caminho<br />
Do grande sonho sem janelas,<br />
De estar contigo no moinho,<br />
Sem o moleiro nem as velas.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-35540494453907171982016-12-31T22:23:00.001+00:002016-12-31T22:23:22.404+00:00#63 - "Já nada me interessa. Levanta-te e dá-me o vinho!", Omar Khayyam<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Já nada me interessa. Levanta-te e dá-me o vinho!</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Esta noite, a tua boca é a mais bela rosa do universo...</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Vinho! Que ele seja rubro como as tuas faces</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
e os meus remorsos tão leves como os anéis da tua cabeleira.</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: 12px; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
<span style="font-size: x-small;">(versão: Fernando Castro) </span></div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-54952028843770351392016-12-29T12:28:00.000+00:002016-12-29T12:29:59.016+00:00#62 - AROMA, Carlos Queirós<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Não invejo quem possa merecer</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
A realidade da tua presença.</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Prefiro imaginar-te de intangível matéria,</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Com medo de acordar a Beleza que sonha</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Na inefável harmonia dos teus gestos...</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Assim fosse o teu corpo uma espécie de aroma,</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Que apenas preenchesse o ar que eu respirasse!</div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-87336573530914465532016-12-28T14:18:00.002+00:002016-12-28T14:18:45.472+00:00#61 - VOLÚPIA, Florbela Espanca<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
No divino impudor da mocidade,</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Nesse êxtase pagão que vence a sorte,</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Num frémito vibrante de ansiedade,</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Dou-te o meu corpo prometido à morte!</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
A sombra entre a mentira e a verdade…</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
A nuvem que arrastou o vento norte…</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
-- Meu corpo! Trago nele um vinho forte:</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Meus beijos de volúpia e de maldade!</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Trago dálias vermelhas no regaço…</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
São os dedos do sol quando te abraço,</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Cravados no teu peito como lanças!</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
E do meu corpo os leves arabescos</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Vão-te envolvendo em círculos dantescos</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Felinamente, em voluptuosas danças…</div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-81695992621221009112016-12-22T13:24:00.000+00:002016-12-22T13:24:00.588+00:00#60 - CABELOS, Cesário VerdeÓ vagas de cabelo esparsas longamente,<br />
Que sois o vasto espelho onde eu me vou mirar,<br />
E tendes o cristal dum lago refulgente<br />
E a rude escuridão dum largo e negro mar;<br />
<br />
Canelos torrenciais daquela que me enleva,<br />
Deixai-me mergulhar as mãos e os braços nus<br />
No báratro febril da vossa grande treva,<br />
Que tem cintilações e meigos céus de luz.<br />
<br />
Deixai-me navegar, morosamente, a remos,<br />
Quando ele estiver brando e livre de tufões,<br />
E, ao plácido luar, ó vagas, marulhemos<br />
E enchamos de harmonia as amplas solidões.<br />
<br />
Deixai-me naufragar no cimo dos cachopos<br />
Ocultos nesse abismo ebânico e tão bom<br />
Como um licor renano a fermentar nos copos<br />
Abismo que se espraia em rendas de Alençon!<br />
<br />
E ó mágica mulher, ó minha Inigualável,<br />
Que tens o imenso bem de teres cabelos tais,<br />
E os pisas desdenhoas, altiva, imperturbável,<br />
Entre o rumor banal dos hinos triunfais;<br />
<br />
Consente que eu aspire esse perfume raro,<br />
Que exalas da cabeça erguida com fulgor,<br />
Perfume que estonteia um milionário avaro<br />
E faz morrer de febre um louco sonhador.<br />
<br />
Eu sei que tu possuis balsâmicos desejos,<br />
E vais na direcção constante do querer,<br />
Mas ouço, ao ver-te andar, melódicos harpejos,<br />
Que fazem mansamente amar e enlanguescer.<br />
<br />
E a tua cabeleira, errante pelas costas,<br />
Suponho que te serve, em noites de Verão,<br />
De flácido espaldar aonde te recostas<br />
Se sentes o abandono e a morna prostração.<br />
<br />
E ela há-de, ela há-de, um dia, em turbilhões insanos<br />
Nos rolos envolver-me e armar-me do vigor<br />
Que antigamente deu, nos circos dos romanos,<br />
Um óleo para ungir o corpo ao gladiador.<br />
<br />
............................................................................<br />
............................................................................<br />
<br />
Ó mantos de veludo esplêndido e sombrio,<br />
Na vossa vastidão posso talvez morrer!<br />
Mas vinde-me aquecer, que eu tenho muito frio<br />
E quero asfixiar-me em ondas de prazer.<br />
<div style="text-align: right;">
<em></em><br /></div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-52624069252435275742016-12-21T13:42:00.000+00:002016-12-21T13:42:08.508+00:00#59 - CINEMATOGRAFIA, Alexandre de AragãoCego, o comboio corre léguas,<br />
Com furioso e soturno martelar:<br />
Dum cavaleiro medievo,<br />
Que só sabe vencer,<br />
Lembra-me o galopar...<br />
<br />
Tem pressa de levar-me<br />
À Cidade do Prazer.<br />
<br />
Lá fora, os véus do luar ondulam<br />
Sobre os prados;<br />
Passam tapetes imensos,<br />
Amarelos e arroxeados,<br />
Que parecem suspensos...<br />
<br />
Chego, e o meu desejo se persuade<br />
<div style="text-align: left;">
Do coquetismo da cidade.</div>
<br />
Há ruas longas, lisas como braços,<br />
Com vestidos de mosaicos,<br />
Onde mulheres de perfil lendário,<br />
E olhos arcaicos,<br />
Se cruzam como peixes num aquário...<br />
<br />
Quando esta perspectiva<br />
No meu País dos Sonhos se alongava,<br />
Já o Tédio, a meu lado,<br />
O sangue me gelava:<br />
<br />
Como ele vinha disfarçado!<br />
<br />
Eis o meu corpo, filhas das Luxúrias,<br />
Tratai-o qual inimigo:<br />
Não esqueçais que o saber<br />
E a lentidão dum ritual antigo<br />
São a chave do prazer...<br />
<div style="text-align: right;">
<span style="font-size: xx-small;"></span><br /></div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-22320727679293349352016-12-19T13:42:00.000+00:002016-12-19T13:42:08.658+00:00#58 - AO RIGOR DE LISI, Frei Jerónimo BaíaMais dura, mais cruel, mais rigorosa<br />
Sois, Lisi, que o cometa, rocha ou muro<br />
Mais rigoroso, mais cruel, mais duro,<br />
Que o Céu vê, cerca o Mar, a Terra goza.<br />
<br />
Sois mais rica, mais bela, mais lustrosa<br />
Que a perla, rosa, Sol, ou jasmim puro,<br />
Pois por vós fica feio, pobre e escuro,<br />
Sol em Céu, perla em mar, em jardim rosa.<br />
<br />
Não viu tão doce, plácida e amena,<br />
(Brame o Mar, trema a Terra, o Céu se agrave),<br />
Luz o Céu, ave a Terra, o Mar sirena.<br />
<br />
Vós triunfais de sirena, luz e ave,<br />
Claro Sol, perla fina, rosa amena,<br />
Mor cometa, árduo muro e rocha grave.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-77371645201856989202016-11-28T13:11:00.000+00:002016-11-28T13:11:06.502+00:00#57 - "Acesa a lâmpada p'la noite adiante,", poema sânscrito anónimo<br />
Acesa a lâmpada p'la noite adiante,<br />
e o meu amado sempre ardente amante.<br />
Mas quão de amor sabia o meu amado!<br />
O amor fazia com subtil cuidado.<br />
Que a cama, de indiscreta, rangeria<br />
para contar ao mundo o que sentia.<br />
<br />
<span style="font-size: x-small;">(versão de Jorge de Sena)</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-31965465739814382082016-11-20T15:59:00.000+00:002016-11-20T15:59:38.842+00:00#56 - "Estuando em risos no prazer de dar-se,", poema sânscrito anónimo<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
Estuando em risos no prazer de dar-se,</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
a minha amada com ardor lutava</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
para ganhar a palma da vitória.</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
No frágil corpo a força lhe faltava;</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
e quando percebeu que o grande feito</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
além do seu poder se conservava,</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
exausta se quedou antes do fim,</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
e só com o ansioso olhar me suplicava</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; padding: 0px;">
que o que faltava me coubesse a mim.</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: 12px; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: 12px; padding: 0px;">
versão de Jorge de Sena</div>
<div style="color: #333333; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: 12px; padding: 0px;">
<br /></div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-73742313208581214062016-10-31T13:55:00.000+00:002016-10-31T13:55:03.477+00:00#55 - «Tão firmes são as suas ancas,» poema sânscrito anónimoTão firmes são as suas ancas,<br />
de tão suave interior,<br />
que não há no mundo imagens<br />
para dizê-las melhor.<br />
<br /><br />
<span style="font-size: x-small;">(versão de Jorge de Sena)</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-66669380080028819832016-10-27T13:20:00.000+01:002016-10-27T13:20:13.499+01:00#54 - DESNUDECES, Mario BenedettiDesnuda una mujer vale la pena<br />
cuando la contemplamos a distancia<br />
porque después / si estamos sobre ella<br />
sólo la vemos con la boca ansiosa<br />
<br />
una mujer desnuda es un silencio<br />
que no admite pudor ni violaciones<br />
un silencio a menudo tembloroso<br />
de tanto amor y tanta profecia<br />
<br />
una mujer desnuda tiene normas<br />
puede dejarse amar con toda el alma<br />
con todo el cuerpo a veces / pero nunca<br />
con el arte de besos fariseosUnknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-48199803971891470362016-10-19T18:22:00.000+01:002016-10-26T12:27:10.168+01:00#53 - "Ao ver a sua boca ao pé da minha boca,", AmaruAo ver a sua boca ao pé da minha boca,<br />
desviei o olhar. E as mãos pus nos ouvidos,<br />
quando as palavras dele retiniam.<br />
Também escondi com as mãos o suor de enleio<br />
que a fronte me perlava. Tentei tudo.<br />
Mas que fazer, quando senti que as vestes<br />
por si caíam pelo meu corpo abaixo?<br />
<br />
<br />
<span style="font-size: x-small;">(versão de Jorge de Sena)</span>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-11490551258450393352016-10-12T13:10:00.000+01:002016-10-12T13:10:01.940+01:00#52 - MISTERIO GOZOSO, Cecília QuílezPerdóname labio porque no te pertenezco,<br />
esta plegaria la dicta su lugar hueco.<br />
Mis manos me llevan a sitios prohibidos,<br />
enredando las sábanas, pensándote a solas<br />
como un perro lazarillo bien adiestrado.<br />
<br />
Porque es tan casto este ardor<br />
que mi boca peca de ser aún doncella<br />
y llaga mi lengua cada vez que te besa.<br />
Ah, la hiel de tu silencio distante e indefinido<br />
me ha convertido en una virgen impura.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-82238331471867188612016-10-07T13:57:00.000+01:002016-10-07T13:57:11.150+01:00#51 . MARIA MADALENA, Álvaro FeijóI<br />
<br />
VIVENDO<br />
<br />
Túnica branca a roçagar, silente,<br />
as formas gráceis do corpo leve,<br />
desnudo o colo dum alvor de neve,<br />
cristal o olhar tão luminoso e ardente;<br />
<br />
Figura esbelta, fugidia e breve,<br />
prendendo ao corpo dela o olhar da gente,<br />
cedendo Amor, pedindo Amor crescente,<br />
desnudo o colo dum alvor de neve.<br />
<br />
Vivendo a lei da Vida, como a Terra<br />
que ama a semente e no seu ventre a encerra,<br />
a alimenta, a agasalha e a reproduz,<br />
<br />
Lábioos sorrindo sem esgares de pena,<br />
Deusa de Amor -- Maria Madalena<br />
passa e, empós dela, só há rastros de luz.<br />
<div style="text-align: right;">
<span style="font-size: xx-small;"></span><br /></div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-73876690335334101852016-10-04T13:06:00.000+01:002016-10-04T13:06:03.939+01:00#50 - A UMA TRANÇA DE CABELOS NEGROS, Jerónimo Baía<br />
Diversa em cor, igual em bizarria<br />
Sois, bela trança, ao lustre de Sofala;<br />
Luto por negra, por vistosa gala,<br />
Nas cores, noite, na beleza, dia.<br />
<br />
Negra, porém, de amor na monarquia<br />
Reinais, senhora, não sereis vassala;<br />
Sombra, mas toda a luz não vos iguala,<br />
Tristeza, mas venceis toda a alegria.<br />
<br />
Tudo sois, mas eu tenho resoluto<br />
Que sois só na aparência enganadora,<br />
Negra noite, tristeza, sombra, luto.<br />
<br />
Porém, na essência, ó doce matadora,<br />
Quem não dira que sois, e não diz muito,<br />
Dia, gala, alegria, luz, senhora?Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-71486323386205356722016-09-29T13:46:00.000+01:002016-09-29T13:46:03.776+01:00#49 - "Ternos amadores caminhavam", Helder Moura Pereira<br />
Ternos amadores caminhavam<br />
no caminho que ia dar ao ponto<br />
mais alto da serra, desapareceram<br />
na luz do sol, davam e tiravam<br />
as mãos, vestiam de maneira quase<br />
igual pelo azul do mar. Espião<br />
apenas do suspeito? Também os<br />
pássaros, os arbustos um pouco<br />
inclinados ao vento, as conchas<br />
calcinadas, mistura de cheiros<br />
bons. Os espinhos secos cravavam-se<br />
nas pernas, vi o que não vi, a<br />
ofegante respiração, o alegre<br />
final. Distante da ameaça e do<br />
perdão deixem-me entrar nesse jogo,<br />
apenas mais um.Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-202813299156020542016-09-27T13:42:00.000+01:002016-09-27T13:42:01.738+01:00#48 - INTANGÍVEL, Cândido GuerreiroNo voo em que me enlevo a procurar-te,<br />
Mergulho no infinito, e até parece<br />
Que um murmúrio de cântico e de prece<br />
Me embala e vai comigo a toda a parte...<br />
<br />
E toda a sombra má desaparece,<br />
E toda a luz é para iluminar-te,<br />
A música de Deus para cantar-te,<br />
Por ti se enflora a terra e o sol aquece...<br />
<br />
Por ti, que enches o mundo e não te vejo,<br />
Onda incorpórea e hálito disperso,<br />
Nuvem de fogo e sonho de desejo!<br />
<br />
Por ti, que diluída no universo,<br />
És o dulçor que encontro em cada beijo,<br />
A harmonia que busco em cada verso!...<br />
<div style="text-align: right;">
<span style="font-size: xx-small;"></span><br /></div>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7114980217821760624.post-56268984391138646962016-09-19T13:02:00.000+01:002016-09-19T16:10:10.568+01:00#47 - DEPOIS DO AMOR, Luís Filipe ParradoDe mais nada posso falar,<br />
só deste cheiro a fruta espessa, crua,<br />
que de ti me fica nos dedos,<br />
na polpa, entre as unhas,<br />
mesmo depois do sabonete e da água corrente.Unknownnoreply@blogger.com0